25 de mar. de 2007

Uma coisa que me incomoda

Uma coisa que me incomoda é quando a crítica ao que acontece no Brasil acaba por ser confundir com a crítica ao Brasil em si mesmo. Por exemplo, alguém consegue imaginar Milton Friedman, ao observar como os EUA adotaram medidas cada vez mais intervencionistas, simplesmente dissesse: "ah os EUA não tem jeito, esse povo burro que não consegue compreender o funcionamento da ordem liberal!" Ou: "o controle de preços adotado pelo governo Nixon é a prova cabal de que o americano está fadado ao fracasso, por repetir medidas já provadas ineficazes ao longo da história".

Mas eu consigo imaginar muita gente boa dizendo o mesmo sobre o Brasil. Por que isto ocorre? Por que achamos que nosso país está fadado ao fracasso?

Quando eu leio a trilogia "Direito, legislação e liberdade", do grande pensador Hayek, vejo a condenação do erro intelectual. Não há lamentações quanto ao "caráter" dos povos, por exemplo. Ou as críticas que Popper e Aron fizeram ao pensamento marxista, que é reduzido ao seu escopo apropriado, é sempre uma batalha de idéias, que são julgadas inadequadas.

Enfim, é isso: idéias inadequadas, quando aplicadas à interpretação da realidade e servem de motivação para a ação, acabam por produzir resultados desastrosos.

A França civilizada possui uma taxa de desemprego de 10%, que é praticamente a mesma taxa existente no Brasil. Até bem pouco tempo atrás, a taxa de desemprego da Espanha superava os 20%. Hoje, é menor que a francesa. Alguém me dirá que ocorreu uma revolução cultural na Espanha? Provavelmente não.

A verdade é que o conhecimento sobre o funcionamento da economia, devido ao fato deste estudo ter se desenvolvido de maneira mais formal apenas em época tardia, nunca fez parte do cânone do homem culto. Talvez isso só tenha ocorrido, em parte, no mundo anglo-saxão.

O resultado de mercado é fruto da ação humana, mas não da intenção humana. No mercado, o intelectual é um agente econômico como os demais. Sua posição é rebaixada, e seus argumentos tem o mesmo valor que os argumentos de qualquer pessoa. Inclusive pode ser pior remunerado do que um jogador de futebol, por exemplo.

O intelectual é relutante em admitir autonomia para pessoas que não são tão cultas quanto ele. E esta relutância apenas aumenta pelo fato de que o conhecimento econômico está ausente do cânone do homem culto.

Talvez por isso a insistência em conectar nossos resultados a ausência de cultura, ou a uma burrice ancestral.

Um comentário:

Cláudio disse...

Mesmo povos com uma cultura que favoreça o desenvolvimento podem sofrer baques financeiros. E se recuperarão. Entretanto povos que cultuam o atraso jamais conseguirão. Sólidas instituições somente aparecem quando há uma busca por ela e, paralelamente, um rechaço dos valores que lhes são contrários.

A França está na situação que está justamente por ter abraçado a cultura do atraso. A sorte deles é que fizeram isso quando já eram ricos. Caso nada mude, a França corre sério risco de se tornar um país "em desenvolvimento" no futuro. Nós, infelizmente não podemos nos dar este luxo. E vamos ficando cada vez mais bárbaros. E conseqüentemente cada vez mais pobres.

Não conheço um país sustentavelmente desenvolvido com cultura similar à nossa. As instituições são reflexo do seu povo.